Depois do câncer de cólon e de reto, o câncer gástrico é o tumor do trato gastro-intestinal mais frequente no Brasil. No entanto, sua incidência vem caindo nas últimas décadas, talvez pela melhora das condições de preparo e armazenamento dos alimentos. A incidência nos homens é 1,5 vez maior do que nas mulheres. A faixa etária mais atingida é a que vai dos 50 aos 70 anos de idade. Aproximadamente dois terços dos casos ocorrem acima dos 65 anos de idade.
Anatomia
Situado entre o esôfago e o duodeno, na parte superior da cavidade abdominal, o estômago se divide em cinco regiões:
- Cárdia: porção superior mais próxima do esôfago, na qual está localizado um esfíncter muscular que impede o refluxo do conteúdo gástrico para o esôfago;
- Fundo: porção situada logo após a cárdia;
- Corpo: entre a cárdia e o antro, é a maior região do estômago;
- Antro: porção mais baixa e mais próxima do duodeno;
- Piloro: funciona como uma válvula que controla o esvaziamento gástrico, isto é, a passagem de alimentos e líquidos do estômago para o duodeno. A parede do estômago tem quatro camadas: a mais interna é a mucosa, seguida das camadas submucosa, muscular (camada longitudinal, circular e oblíqua) e, por último, a serosa, que reveste a parte externa do órgão.
Sinais e sintomas
Sensação de inchaço no abdômen após as refeições; dor abdominal tipo úlcera (azia forte); náuseas; perda de apetite; indigestão periódica; diarreia ou constipação; perda de peso súbita e progressiva; sangramento no vômito; etc.
Diagnóstico
O diagnóstico do câncer de estômago é feito, principalmente, por meio da endoscopia digestiva alta, que permite a visualização direta da lesão e a obtenção de material para análise em microscópio (biópsia).
Nesse exame, um tubo flexível de fibra ótica (ou uma microcâmera) é introduzido na boca e conduzido até o esôfago, estômago e duodeno. O exame pode ser realizado sob sedação e com anestesia da garganta, minimizando o desconforto.
Após confirmação por endoscopia outros exames deverão ser realizados. A ecoendoscopia digestiva alta pode avaliar o grau de invasão da parede e linfonodos loco regionais, a tomografia computadorizada e o pet – scan podem acrescentar dados para posterior programação de tratamento.
História natural da doença
Os adenocarcinomas de estômago têm origem na camada mucosa. Habitualmente, nas fases iniciais não há sintomas; quando existem, podem ser confundidos com os das gastrites e das indisposições digestivas que melhoram com o uso de antiácidos e de bloqueadores da produção de ácido. Nessa fase silenciosa, o crescimento é lento; pode durar de um a três anos. Por essa razão, em países com alta incidência desse tipo de câncer, como o Japão, há programas preventivos de detecção precoce através da endoscopia.
Perdida a oportunidade do diagnóstico precoce, o crescimento se torna mais rápido, e o tumor pode formar úlceras na mucosa, penetrar as camadas mais profundas do estômago e atingir os linfonodos responsáveis pela drenagem linfática. Com o crescimento, pode haver invasão dos órgãos vizinhos por proximidade: esôfago, duodeno, pâncreas e baço.
Quando a doença se torna disseminada, há possibilidade de comprometimento de linfonodos torácicos e abdominais, fígado, peritônio, pulmões, ovário etc.
Tipos de câncer de estômago
O adenocarcinoma constitui mais de 90% dos tumores de estômago. Vale ressaltar que, quando se diz que alguém tem câncer de estômago, subentende-se que se trate de adenocarcinoma.
Tipos mais raros:
Os demais 5% a 10% incluem os tumores neuroendócrinos, os tumores estromais do trato digestivo, também chamados de gist, e os linfomas.
Tratamento
O tipo de tratamento é definido a partir do estádio em que a doença se apresenta. O tratamento abordado neste capítulo refere-se exclusivamente aos adenocarcinomas, tumores gástricos mais comuns.
Estádio I
Nessa fase, em que o tumor está confinado ao estômago, em geral com invasão superficial, a doença é altamente curável por meios cirúrgicos. Pode-se recorrer a uma cirurgia endoscópica (infelizmente, poucos são os candidatos a esse procedimento, porque mesmo tumores ainda localizados, com frequência, invadem mais profundamente a parede gástrica) ou uma cirurgia radical. Neste último caso, partes do esôfago e do intestino poderão ser removidas. Ocasionalmente, também é preciso retirar o baço. Na gastrectomia total, o cirurgião fará uma reconstrução do trânsito digestivo pela união do intestino delgado ao esôfago, com o intuito de criar um novo reservatório para substituir o estômago.
Estádios II, III e IVA
Para o estádio II, em que o tumor invade a camada muscular do estômago, e/ou compromete até seis linfonodos próximos ao estômago; ou estádio III, em que invade a serosa ou compromete de sete a 15 linfonodos, ou estádio IVA, em que invade mais de 15 linfonodos ou órgãos vizinhos, o tratamento indicado é a cirurgia radical, acompanhada ou não de quimioterapia, com ou sem radioterapia.
Cirurgia radical
O tratamento mais usado nesses estádios é a cirurgia (gastrectomia), que deve incluir a remoção do tumor, dos linfonodos regionais e das estruturas vizinhas invadidas por proximidade. Como, em geral, o risco de disseminação da doença é mais alto nesses casos, há indicação de quimioterapia complementar, que pode ser realizada antes (neoadjuvante) ou depois da cirurgia (adjuvante). Com a mesma preocupação, alguns grupos acrescentam radioterapia ao tratamento complementar, depois da cirurgia.
Quimioterapia adjuvante (pós-operatória)
No caso de lesões que ultrapassaram a camada muscular e chegaram até a serosa do estômago ou comprometeram os linfonodos, a quimioterapia pode reduzir a chance de recidiva do tumor. A duração do tratamento é de 18 a 24 semanas.
Quimioterapia neoadjuvante (pré-operatória)
Em tumores que invadem pelo menos a camada serosa da parede gástrica, recomenda-se a administração de quimioterapia pré-operatória, pois além de poder reduzir o tamanho do tumor, facilitando a futura cirurgia, aumenta as chances de cura. A duração do tratamento neoadjuvante é da ordem de nove a 12 semanas antes da cirurgia e pelo mesmo período após a gastrectomia. As medicações com atividade antineoplásica indicadas no tratamento adjuvante ou neoadjuvante incluem cisplatina, oxaliplatina, 5-fluorouracil, paclitaxel, docetaxel, irinotecano, capecitabina e epirrubicina.
Radioterapia pós-operatória
Pacientes em boas condições clínicas, operados de tumores que invadem até a camada serosa ou os linfonodos regionais, podem beneficiar-se da associação de radioterapia à quimioterapia após a cirurgia.
A quimioterapia é administrada durante o tratamento radioterápico por cerca de cinco semanas, terminada a radioterapia, o tratamento quimioterápico continua.
Estádio IVB
Quando o câncer atinge o estádio IVB, invadindo órgãos como pulmões, fígado, peritônio ou ossos, o tratamento indicado é a quimioterapia, com ou sem trastuzumabe, além do acompanhamento nutricional.
Quimioterapia
Os medicamentos mais utilizados são: cisplatina, oxaliplatina, 5-fluorouracil, docetaxel, paclitaxel, irinotecano, capecitabina, epirrubicina e mitomicina C. Os efeitos colaterais mais observados são queda de cabelo, fadiga, náusea, vômito, aftas na boca, diarreia, maior predisposição a infecções, zumbido nos ouvidos, formigamento nos dedos das mãos e dos pés e alteração da função renal. Em geral, são efeitos colaterais transitórios e de leve intensidade.
Em algumas situações diagnosticadas através da análise do próprio tumor, que demonstra a presença da proteína HER-2 na membrana de célula cancerosa, acrescenta se à quimioterapia um novo medicamento, um anticorpo chamado trastuzumabe, a fim de potencializar seus efeitos benéficos. A escolha do esquema inicial depende da atividade das drogas empregadas, mas também da idade e do estado de saúde do paciente.
Aspectos nutricionais
Em caso de tumores muito avançados, que obstruem a passagem de alimentos, é possível introduzir uma prótese (stent) no local para vencer a obstrução ou realizar uma cirurgia com o objetivo de ligar a parte proximal (sadia) do estômago ao intestino delgado.
Caso esses procedimentos não sejam viáveis, é possível se estudar a colocação de sonda nasoenteral (introduzida pelo nariz para ultrapassar a zona de obstrução), de realização de gastrostomia (sonda colocada diretamente no estômago através da parede abdominal) ou de jejunostomia (sonda colocada
diretamente no intestino delgado através da parede abdominal).
Prognóstico
Para definição de prognóstico o paciente deve realizar uma avaliação médica minuciosa e geralmente multidisciplinar. Cirurgião e Oncologista clínico solicitarão exames para definir junto ao paciente aonde se pode chegar.
Algumas Neoplasias são curáveis, algumas controláveis e outras devemos buscar conforto e apoio ao paciente.
O que é um cirurgião do aparelho digestivo?
Cirurgiões do aparelho digestivo são especialistas no tratamento cirúrgico e não cirúrgico de doenças do aparelho digestivo alto (esôfago, estomago, intestino delgado, pâncreas, vias biliares. Eles completaram o treinamento cirúrgico avançado no tratamento dessas doenças, assim como a formação completa em cirurgia geral.
Os cirurgiões certificados pelo Colégio brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD) completam residências em cirurgia geral e cirurgia do aparelho digestivo, e devem passar por testes intensivos (prova de título) realizados pela Sociedade Brasileira de cirurgia digestiva. Estes cirurgiões têm conhecimento no tratamento das doenças benignas e malignas do aparelho digestivo, e tem capacidade para realizar exames de detecção rotineiros e tratar cirurgicamente estes problemas caso seja necessário.